segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Seja um Prof. Dr. com cinco cliques


Dá para se divertir com esse mecanismo criado pela Universidade de Chicago (onde Obama deu aulas), "Write your own academic sentence", por meio do qual é possível montar frases herméticas, de termos complicados e sem sentido, mas que soam cultíssimas, como as presentes em artigos (ou papers) de respeitados doutores e pós-doutores. Usá-lo é bastante simples: basta escolher, nos menus disponíveis, quatro palavras ou expressões possantes ("instituições pedagógicas", "sistematização", "hegemonia pós-capitalista"...), clicar em "Write it" e pronto, lá está sua frase acadêmica. Se não for do seu agrado, é só clicar em "Edit it", que ela volta com os termos dispostos em outra ordem - e continuando sem dizer nada, é claro. Eu fiz a minha: "The historicization of civil society is homologous with the (re)formation of the public sphere" ("A historicização da sociedade civil é homóloga à (re)ordenação da esfera pública"). E a editei: "The (re)formation of civil society is homologous with the historicization of the public sphere" ("A (re)ordenação da sociedade civil é homóloga à historicização da esfera pública"). Melhor, só se viesse com a nota de rodapé correspondente.

A ferramenta, e o que ela significa, fez-me lembrar de duas obras criativas. Lembrei-me de "O Homem que Sabia Javanês", ótimo conto do grande Lima Barreto, em que um malandro precisando de dinheiro passa-se por 'especialista' em uma obscura língua malaia, o javanês, para faturar a recompensa de um velho ansioso por conhecer a (supostamente) poderosa mensagem contida num alfarrábio escrito no idioma. O sujeito, por 'conhecer' tão incomum língua e cultura (na verdade, ele só memoriza alguns chavões e termos básicos), acaba rico e prestigiado, convidado para participar de seminários no exterior, para colaborar com a imprensa e para assumir um cargo no governo, obviamente. O conto é uma crítica ácida e pertinente de Lima não só ao vazio intelectual, mas ao comportamento servil do brasileiro diante dele, diante de quem, por "falar difícil", aparenta grande sabedoria sobre um dado assunto. E lembrei-me também do filme "Annie Hall", do Woody Allen, em que o personagem dele comenta para a mulher, pesquisadora universitária: "That's one thing about intellectuals: they've proved that you can be absolutely brilliant and have no idea what's going on"...


(Lucas Colombo)

2 comentários:

Leo Fleck disse...

Hehehe muito boa essa!

Moziel T.Monk disse...

Grande Lucas! Esse mecanismo aí lembra o famoso "gerador de lero-lero" (http://padrelevedo.hpg.ig.com.br/lerolero/lerolero.html) desenvolvido pelo saudoso Padre Levedo, capaz de gerar uma mixórdia sem sentido, mas que poderia muito bem servir de discurso em reuniões corporativas ou preencher trabalhos acadêmicos.
Coincidência ou não, estou aqui preparando uma retrospectiva das coisas que NÃO escrevi no blog e uma delas é justamente essa trapaça intelectual tão comum aqui em Pindorama, e justamente citaria o conto do Lima Barreto, melhor exemplo desse tipo de estelionato cultural.
E falando em coisas que não escrevi, vamos ver se neste fim-de-semana sai aquele outro texto sobre o Roy Castro. Abraços!