sexta-feira, 14 de novembro de 2008

De livros e bairrismos


Está terminando a 54ª edição da Feira do Livro de Porto Alegre. As vendas caíram neste ano, conforme informações da Câmara Rio-Grandense do Livro, organizadora da feira. Queda de 9%, em comparação com o ano passado. Com a recessão econômica batendo às portas do mundo todo, já era de se esperar um esfriamento nas vendas. O clima na Praça da Alfândega também foi de redução de consumo. De qualquer modo, a Feira, mesmo não tendo mais o encanto que tinha anos atrás, segue como um grande evento literário. Eu sempre compareço às edições e fico feliz em ver toda aquela movimentação em torno de livros. Livros! Mesmo que as pessoas estejam ali em busca do best-seller do momento, daquele romance sentimentalóide sobre o Afeganistão ou do último lançamento do Paulo Coelho, elas estão ali por causa de livros, ponto. Isso já é uma grande coisa. A movimentação em volta das estandes, as sacolas cheias, as filas de autógrafos formadas por gente de todos os tipos representam a sobrevivência do livro, nos dias de hoje. Ao contrário do que muitos pensam, ele continua sendo um elemento muito importante na cultura e na sociedade. Ainda vai existir por muito tempo, sim, senhor.

Só o que não deveria sobreviver é o bairrismo infantil dos gaúchos. Eu fui à Feira na segunda, dia 10. Quando terminei de comprar os títulos que queria, fui ao bistrô do Margs para tomar um café e folhear minhas novas aquisições. Havia música ao vivo, um rapaz cantando e tocando violão. Não bastasse ter assassinado "A Rita", de Chico Buarque, ele ainda atacou com o Hino Rio-Grandense, em uma versão 'pop', digamos. O público, até então indiferente, despertou ao ouvir os versos de "sirvam nossas façanhas/de modelo a toda terra", aplaudindo efusivamente no final, com gritinhos de uhuuu e tudo. Poucas vezes na minha vida presenciei cena tão ridícula. O que eles pensam que o Rio Grande do Sul tem de tão especial? Não é um estado da federação igual a qualquer outro? Há motivos para o povo daqui se achar tanto assim? Essas pessoas deveriam usar os livros que compraram na Feira para incrementar o senso crítico e ampliar suas visões de mundo. Deixar-se cegar é algo muito grave.

Ainda bem que uma das obras que comprei por lá é um delicioso antídoto a essa catatonia: "Triste Fim de Policarpo Quaresma", em que o grande Lima Barreto satiriza o ufanismo quixotesco do brasileiro. Magnífico.

(Lucas Colombo)

2 comentários:

Vanessa Reis disse...

Lucas, PARABÉNS!
Eu moro no Rio Grande do Sul há 12 anos, nasci em Minas Gerais, e apesar de amar muito este lugar, concordo com cada vírgula do que você disse. Cheguei a um ponto que não suporto mais o bairrismo gaúcho. Essa coisa de "melhor porque é daqui", "melhor porque é nosso". Como se algum dia alguém de algum outro canto do país tivesse dito que aqui não é legal e os gaúchos precisassem se defender. Tenho uma tese sobre esse sentimento de superioridade gritado aos quatro ventos ser fruto de uma profunda sensação de inferioridade. Sei de uma porção de gaúchos que moram fora do estado e não tem a menor vontade de voltar pra cá. Enfim, é bom perceber que nem todos estão cegos. Belo texto.

Anônimo disse...

Ótimo comentário, Vanessa. Obrigado.