Sempre que sai um Woody Allen, as reações são duas, opostas: 1. “Woody volta à boa forma!”. 2. “Mais uma porcaria. Bom é só o Woody dos anos 80”. O primeiro grupo não faz crítica; confunde desejo com realidade, pois o diretor nunca voltou à forma que exibia nos anos 80, ainda que em ótimos momentos como Match Point e Midnight in Paris. O segundo grupo se comporta do modo que Paulo Francis descreveu como “irritação do amante rejeitado”. Ama tanto Woody que não aceita nada abaixo de uma obra-prima por ano. Não percebe que um Woody Allen nota 7 ainda está acima do que se vê por aí nos cinemas. É o caso de Roda Gigante, de 2017. O título é apropriado, porque Woody tem andado em círculos: a história lembra o recente Blue Jasmine e o mais antigo Setembro, com a personagem, Ginny (Kate Winslet, contida e precisa, as usual), que carrega culpa por um erro definidor de sua vida, tem família disfuncional e se apaixona por um homem no qual deposita muitas esperanças. Trata-se mesmo de um Woody Allen menor, sem a classe exibida nos anos 80 e 90. A fotografia carregada, de cores quentes, é redundante, over como a interpretação de Jim Beluchi e a canastrice de Justin Timberlake, ator que parece ter como único recurso de interpretação balançar a cabeça. Mas o bom roteiro está lá, rico em referências: das tragédias gregas, com a “heroína” condenada pelo destino ao sofrimento, ao teatro moderno de Eugene O’Neil e Tennessee Williams (Ginny tem muito de Mary Tyron e de Blanche Dubois). Roda Gigante é mesmo “teatral”, de várias (e longas, o que é comum no diretor) cenas internas, mas isso não chega a ser problema. E é um filme tão bem escrito (“- Você acha que a tragédia que ocorre com uma pessoa é sempre culpa dela? - Não. O destino também tem um papel nisso. Há na vida mais coisas que fogem ao nosso controle do que queremos admitir.”) e tão perspicaz na observação daqueles seres humanos, que só se pode recomendar que seja visto. Apesar dos pesares. Coisas da cultura deste começo de século 21, em que parece se confirmar o aforismo de Karl Kraus: “Quando o sol da cultura está baixo, até anões projetam grandes sombras”. (Lucas Colombo)
sexta-feira, 30 de agosto de 2019
MM Recomenda - Roda Gigante, de Woody Allen
Sempre que sai um Woody Allen, as reações são duas, opostas: 1. “Woody volta à boa forma!”. 2. “Mais uma porcaria. Bom é só o Woody dos anos 80”. O primeiro grupo não faz crítica; confunde desejo com realidade, pois o diretor nunca voltou à forma que exibia nos anos 80, ainda que em ótimos momentos como Match Point e Midnight in Paris. O segundo grupo se comporta do modo que Paulo Francis descreveu como “irritação do amante rejeitado”. Ama tanto Woody que não aceita nada abaixo de uma obra-prima por ano. Não percebe que um Woody Allen nota 7 ainda está acima do que se vê por aí nos cinemas. É o caso de Roda Gigante, de 2017. O título é apropriado, porque Woody tem andado em círculos: a história lembra o recente Blue Jasmine e o mais antigo Setembro, com a personagem, Ginny (Kate Winslet, contida e precisa, as usual), que carrega culpa por um erro definidor de sua vida, tem família disfuncional e se apaixona por um homem no qual deposita muitas esperanças. Trata-se mesmo de um Woody Allen menor, sem a classe exibida nos anos 80 e 90. A fotografia carregada, de cores quentes, é redundante, over como a interpretação de Jim Beluchi e a canastrice de Justin Timberlake, ator que parece ter como único recurso de interpretação balançar a cabeça. Mas o bom roteiro está lá, rico em referências: das tragédias gregas, com a “heroína” condenada pelo destino ao sofrimento, ao teatro moderno de Eugene O’Neil e Tennessee Williams (Ginny tem muito de Mary Tyron e de Blanche Dubois). Roda Gigante é mesmo “teatral”, de várias (e longas, o que é comum no diretor) cenas internas, mas isso não chega a ser problema. E é um filme tão bem escrito (“- Você acha que a tragédia que ocorre com uma pessoa é sempre culpa dela? - Não. O destino também tem um papel nisso. Há na vida mais coisas que fogem ao nosso controle do que queremos admitir.”) e tão perspicaz na observação daqueles seres humanos, que só se pode recomendar que seja visto. Apesar dos pesares. Coisas da cultura deste começo de século 21, em que parece se confirmar o aforismo de Karl Kraus: “Quando o sol da cultura está baixo, até anões projetam grandes sombras”. (Lucas Colombo)
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Postado por Mínimo Múltiplo às 18:52
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